sexta-feira, 1 de agosto de 2008
Ciganos, indesejáveis na França e na Europa
Francesco Pischetola/AFP
Bombeiros tentam conter o fogo em incêndio criminoso num acampamento cigano na Itália
Anne Rodier e Laetitia Van Eeckhout
Os ciganos, também chamados de "roms" indesejáveis na França como em toda parte na Europa, empurrados de uma favela para outra, são alvo de evacuações regulares, o que permite expulsar progressivamente o conjunto da comunidade. Em Lille, 70 pessoas foram expulsas de seu terreno na última terça-feira (29) ; outras 55 foram expulsas de Saint-Etienne para a Romênia em 17 de julho. E até o fim de agosto cerca de 633 roms serão evacuados do maior acampamento da França, situado em Saint-Ouen (Seine-Saint-Denis), de um terreno onde deverão ser construídos conjuntos habitacionais.
A quarta-feira (30) foi o último dia concedido aos roms de Saint-Ouen para se candidatarem a um projeto de reinserção. O Estado e as coletividades locais vão criar na comuna uma "aldeia de inserção". Mais de 300 se candidataram, porém não mais de cem deles poderão se instalar. Os serviços sociais explicam que uma aldeia de inserção não pode receber mais de 20 famílias. As outras terão de partir. O subprefeito do distrito de Saint-Denis, Olivier Dubaut, avisa: "Não vamos tolerar acampamentos selvagens".
Em projetos semelhantes, somente 21 famílias foram escolhidas em Saint-Denis, e 18 em Aubervilliers. "Falta vontade política. Só um apoio financeiro europeu permitiria realizar projetos de maior amplidão", estima Marie-Louise Mouket, responsável pelo Pact Arim 93. Essa associação de inserção pela moradia foi encarregada pela prefeitura de Saint-Ouen de realizar uma pesquisa social. Ela permitirá que o prefeito julgue, conforme critérios à sua discrição, as famílias que têm "a vontade de se integrar na sociedade francesa", no plano profissional, escolar e lingüístico. "Os que não correspondem aos critérios terão a obrigação de deixar o território francês", afirma Dubaut.
Afinal, 400 ciganos de Saint-Ouen estão ameaçados de expulsão e 94 se inscreveram junto aos serviços de imigração (Anaem) para retornar voluntariamente à Romênia. Segundo o Ministério da Imigração, o valor da ajuda para o retorno está mantido em 300 euros por adulto. Mas em Saint-Etienne e em Saint-Ouen os roms afirmam que lhes prometeram apenas 150 euros.
Amostra de saliva
Seja como for, a maioria não quer voltar para a Romênia. "Queremos ficar na França. Quando fecharem o acampamento, iremos para outro lugar, não queremos voltar para a Romênia nunca. O que queremos? Ter o direito de trabalhar aqui", afirma Sorin Boti, 34 anos, azulejista, que vive no acampamento de Saint-Ouen. Retornando voluntariamente ou não, nada impede os que desejarem pegar mais um ônibus para a França.
Desde que entraram na União Européia, em 1º de janeiro de 2007, os romenos e os búlgaros continuam submetidos a dispositivos especiais em termos de trabalho. Mas eles são cidadãos europeus plenos, que se beneficiam da liberdade de circulação, como lembrou o Conselho de Estado em 19 de maio. Como os outros europeus, eles devem além de três meses de permanência "ou ter um emprego, ou possuir meios suficientes de subsistência", segundo a circular de 22 de dezembro de 2006, especialmente publicada pelo Ministério do Interior na véspera de sua entrada na União. Caso não cumpram as condições de permanência, romenos e búlgaros podem ser expulsos. Dos 23.186 estrangeiros expulsos em 2007, 2.271 romenos e 810 búlgaros foram devolvidos a seus países, por bem ou à força.
Os meios associativos denunciam regularmente o absurdo dessas expulsões, pois os roms voltam para a França. De 55 pessoas que partiram de Saint-Etienne em 17 de julho, duas já voltaram em duas semanas, afirma George Gunther, responsável pela Rede de Solidariedade com os Roms. Nessa aglomeração, a comunidade rom continua estável há cinco anos, com 250 a 300 pessoas.
Para evitar que eles voltem à França e se beneficiem várias vezes da ajuda de retorno humanitário, a lei de 20 de novembro de 2007 prevê um fichamento biométrico dos beneficiários da ajuda de retorno. O decreto de aplicação ainda está sendo preparado.
Mas na prática o recenseamento começou. Em Saint-Ouen, a pesquisa social - da qual os roms participaram maciçamente - constitui na verdade um fichamento preciso que será enviado à prefeitura: identidade, data de entrada na França, perfil profissional, médico e escolar. O recenseamento é completado pelos dossiês da Anaem, que trabalha em estreita colaboração com a polícia. Em Saint-Etienne, a prefeitura indica claramente que "o objetivo dos controles é registrar as identidades em um arquivo para entregar as OQTF [obrigação de deixar o território francês] em três meses, antes das evacuações".
Em Alès (Gard), os roms beneficiários da ajuda ao retorno foram convocados pela polícia para tirar impressões digitais, foto e amostra de saliva. "Um caso de proxenetismo envolvia menores, e é nesse âmbito que a autoridade judiciária procedeu à retirada de amostras", explica um conselheiro de Hortefeux. E este insiste: o fichamento biométrico não será aplicado só aos ciganos. De todo modo, na França, assim como na Itália, o fichamento dos roms começou.
Em Portugal, juiz qualifica ciganos de "pérfidos"
O julgamento provocou um clamor em Portugal. Em uma decisão proferida pelo tribunal de Felgueiras na quarta-feira (30) cinco ciganos condenados a penas de prisão por ter agredido policiais foram qualificados pelo juiz de "pessoas malvistas socialmente, marginais, pérfidos, totalmente dependentes do Estado e que lhe pagam desobedecendo e atentando contra a integridade física e moral de seus agentes". A juíza explicou que as condições de habitação dos cinco homens eram "ruins, não devido ao espaço físico em si, mas devido ao estilo de vida de sua etnia (pouca higiene)". Há 50 mil ciganos em Portugal. "Estamos cansados de discriminações", reagiu a Federação de Associações Ciganas do país.
Os ciganos na Europa
A maior minoria da Europa, os ciganos seriam 7 milhões, originários principalmente da Romênia e dos Bálcãs. Seu número é difícil de definir porque existem poucas estatísticas étnicas. O Conselho da Europa define dados que reúnem os ciganos e a "gente de viagem". A Romênia contaria com 1,8 milhão de ciganos e a Bulgária, 650 mil. Na França, 400 mil pessoas são recenseadas como "gente de viagem e roms". Entre elas, os ciganos são muito minoritários.
Os destinos preferidos pelos ciganos fora de seu país de origem são a Itália, com 200 mil roms, e a Espanha, com 700 mil. A Itália deverá fornecer no início de agosto à Comissão Européia um relatório sobre o recenseamento realizado nos acampamentos de Milão, Roma e Nápoles.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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